quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Animal em extinção





Não me olhe assim...

sou do tempo do pique-bandeirinha,

dos pardais e rolinhas.

Sem susto, eles escalavam minha rua a pé.

Se um voava, outra vinha.

Gostoso era pegá-los nas armadilhas

caixas de sapato, vara de bambu e barbante.

Brinquedo barato, o passarinho, pulsando ali,

na mão, me ensinava, no breve instante,

o rico e eterno mistério da vida...

Sou do tempo das borboletas,

dos gafanhotos, das pererecas e da esperança,

saltando no verde do meu quintal...

Sou do tempo em que manga com leite era veneno.

Mas não matava.

Sou do tempo em que muito menos se matava.

Nem o prazer, sem a AIDS, era mortal...

Sou do tempo em que havia príncipes e princesas.

Tempo em que eu mesma, menina, vivia coroada...

Sou do tempo em que pensava ser amada. E era...

Sou do tempo da delicadeza,

das promessas cumpridas... da felicidade.

Ah! Que boa época era aquela...



São Paulo, 31 de agosto de 2010.

Privatização das telecomunicações. O golpe da qualidade





No pais desde sempre entregue à sanha dos saqueadores, o Ministério da Telecomunicações consente... e a Anatel a porta aos piratas.

Ainda me lembro bem (e como não me lembraria?) daquele janeiro de 1998, quando se anunciou a definitiva privatização dos serviços de telecomunicações no Brasil. Obrigados a dormir na fila para comprar linha por um preço que hoje cobre, com folga, os custos de três iPods, até mesmo os nacionalistas raivosos sucumbiram. O argumento era irresistível: mais linhas, a preços mais baixos e, melhor, com qualidade. Retrucar? Quem haveria? Eu mesma, que, durante anos, engrossara o exército de defesa da reserva do mercado brasileiro de computadores para as empresas nacionais, assistindo ao naufrágio do sonho de um selo brasileiro de TI, ponderei e, no mínimo parei para escutar o belo canto da sereia. Mas o título da matéria na qual eu, então, analisava a reviravolta das teles revelava cautela: “Agora, só nos resta torcer”, dizia, no título, a matéria que me valeu o I Prêmio Embratel. Um texto que, aliás, descia a lenha na própria – a Embratel.
Doze anos depois, não se pode negar o salto quantitativo. Brasil afora, são quase 200 milhões de linhas telefônicas, entre fixas e móveis, o que coloca o Pais no topo do ranking mundial da telefonia. Honroso quinto lugar. Espantosa é a disseminação dos celulares, transformados em escritórios móveis e balcões de venda: 176 milhões de linhas ativas, número que promete quase alcançar o de brasileiros. Antes de aprenderem a falar, crianças já têm um celular, mimo de pais assustados com a violência, de avós ou tios generosos.
Tudo estaria perfeito, se os preços ainda não se mantivessem longe, muito longe de corresponder às promessas e, mais, à expectativa de todos nós. Outro dia, Lars, meu amigo sueco, se espantava ao saber que fomos condenados a pagar a assinatura da linha ad-eternum. “Para sempre é muito tempo”, lembrou-me num Português atravessado, mas em mensagem carregada de sabedoria. De fato, para sempre, é a vida toda! Um minuto de ligação por mais de oito centavos, tomando por parâmetro outros mercados, é pura extorsão.
Pior, muito pior, é o flagrante e desavergonhado descumprimento da lei pelas operadoras em diversos outros quesitos. Por exemplo? Os erros na emissão das faturas (sempre para mais, a favor delas próprias, claro!). Quer mais? O tempo de espera na linha, quando se precisa ligar para a Central de Atendimento ao Consumidor, na maioria das vezes, na média, é superior a cinco minutos. Na espera, a pior música (sic). No atendimento, promessas que não se cumprem. “Vamos estar agendando”... Quem já tentou, sem quase infartar, interromper um serviço qualquer sem ser jogado daqui para lá? Uma falta de respeito!
Na telefonia móvel, quem é pré-pago (80% dos assinantes ativos deste pais) sabe o quanto dói... É quase uma punição àqueles que, como eu, se cansaram das más surpresas à apresentação de cada conta de celular pós-pago! Os serviços, sobretudo, os de roaming, são ruins e... muito, muito caros. Outro dia, assinante da TIM, cansada de cair no golpe da caixa postal, desisti dela: toda vez que tentava recuperar um recado, o sistema me informava que o serviço estava “indisponível”. Mas lá se iam meus créditos. Assim, fica fácil faturar!
Mas o pior de tudo é a imoralidade das transações, sempre nebulosas... mal explicadas. A impressão que se tem é de que se está na Camorra... A coisa é mafiosa! Com uma dívida já inimaginável de R$ 19 bilhões, depois de receber R$ 4,4 bilhões desse paizão, quase mãe, chamado BNDES, com a promessa de segurar a onda e garantir o título de maior empresa nacional, a Oi, codinome de Telemar, aquela mesma dos escândalos, de fato, ampliou a área de expansão também na direção Leste—Oeste—Sul, ao incorporar a Brasil Telecom. Mas, nessa brincadeirinha, elevou o rombo para além dos R$ 21 bilhões. Mais adiante, completou o desvario, vendendo 10% do capital à Portugal Telecom. Adeus empresa, nacional! E nós é que pagamos por mais essa deslavada mentira.
Tudo isso se dá embaixo do nariz do Ministério das Telecomunicações e da Agência Nacional de Telecomunicações. No pais desde sempre entregue à sanha dos saqueadores, o governo consente... e a Anatel abre a porta aos piratas.